Categorias: Alimentação | bem estar | Coluna Pediatria

Nova coluna Pediatria – Problemas alimentares na infância e como evitá-los

Compartilhe:
pin it

Mamães, é com imensa alegria que eu trago, hoje, uma novidade super bacana para vocês. Há muito tempo que venho planejando colocar no ar uma coluna sobre pediatria, escrita, é claro, por quem entende do assunto, mas ainda não tinha achado a pessoa certa para fazer isso. Queria que a profissional que fosse escrevê-la tivesse conhecimento, mas que tivesse também bom senso e sensibilidade para falar com as mães, sem impor verdades absolutas (claro que há casos em que não tem discussão),  e que tivesse também disponibilidade para responder uma ou outra dúvida que, por ventura, surgisse.

Pois bem, essa pessoa está aqui, e é a Dra. Kelly Oliveira, formada em medicina pela UNICAMP e em pediatria pela USP e que já colaborou com o blog em outra ocasião, escrevendo esse ótimo post sobre medidas simples e eficazes para acabar com a tosse.

A partir de agora, todos os meses, a Dra. Kelly trará para vocês algum tema relevante relativo à saúde dos pequenos e dará dicas claras e simples de como amenizar ou resolver vários problemas.

A Dra. Kelly ainda salienta que nada substitui uma boa e longa conversa com o pediatra por isso, aqui é um início de bate papo, mas que as dúvidas mais complexas ou mais urgentes deverão ser sempre sanadas com o médico da criança.

Boa leitura e espero que curtam a novidade. Eu amei!

coluna pediatria  - problemas alimentares
Photo Credit: Myles! via Compfight cc

Problemas alimentares na infância e como evitá-los

Por Kelly Oliveira

Este post é para os papais e mamães angustiados (e muitas vezes frustrados) porque seu filho não come como deveria. Vou falar um pouquinho dos motivos pelas quais ele pode não estar comendo, dicas para melhorar o apetite dos pequenos, e o mais importante, como mudar hábitos familiares ruins e erros tão banais que cometemos, como o excesso de guloseimas, o uso da coerção e barganha para fazer a criança comer e até mesmo a falsa percepção de que o filho não come. Considero que o aprendizado é muito maior para os pais do que para a criança em si.

Bom, sente, respire fundo e relaxe! A maneira como encaramos as coisas é fundamental e, como a Shirley comentou num post recentemente, é preciso respeitar o ritmo da sua criança e encarar essa questão com tranquilidade e naturalidade.

A idéia aqui não é esgotar, de forma alguma, o tema. Afinal, são tantas particularidades para cada fase da vida dos pequenos e tantas questões que deverão ser abordadas mais detalhadamente que precisarei de mais de um post para abordá-las. Assim, essa é somente uma introdução ao assunto, para ajudar a começar a compreendê-lo e desmistificá-lo um pouco e, depois, com o tempo, vamos retomar o assunto e elucidar outras dúvidas.

Bom, vamos lá, começando a falar sobre a questão do mecanismo da saciedade. Para saber um pouco como o apetite da criança funciona, precisamos primeiro entender como ocorre o mecanismo da saciedade no corpo humano. Ao ingerirmos o alimento, ocorre uma série de liberações hormonais e mecanismos de regulação que fazem com que tenhamos a sensação da saciedade, e que nos faz parar de comer. Com a criança não funciona diferente… Esse mecanismo nada mais é do que um equilíbrio entre oferta, que corresponde à quantidade de alimento oferecida à criança, e procura, que corresponde às necessidades energéticas dela inerentes à sua idade e tamanho, seja para gasto imediato ou para armazenamento.

Outro ponto importante que devemos analisar diz respeito aos aspectos do comportamento alimentar da criança. Ou seja, o desenvolvimento emocional da criança é extremamente importante para a construção do relacionamento dela com a comida. A criança está em constante processo de mudança, de crescimento e descoberta. A forma como encaramos essa fase inicial é fundamental para a construção de hábitos saudáveis para a vida toda. Um ambiente de amor, carinho e respeito tornam-se assim ingredientes especiais para essa receita dar certo!

Na introdução de alimentos, o apetite é variável e a aceitação também. Num primeiro momento, a criança pode rejeitar um alimento (e isso é completamente normal!). São tantas experiências sensoriais que a criança recebe, tantas descobertas a cada dia! Cada criança tem seu tempo e momento e devemos respeitar isso. No primeiro ano de vida, a criança praticamente dobra de tamanho e triplica o seu peso, sendo esperado um apetite voraz. Após essa fase ocorre uma desaceleração normal do crescimento da criança, e assim seu apetite diminui (lembra do mecanismo de saciedade?). Além disso a criança, nessa idade, passa de expectador a explorador do mundo e de novas descobertas, sendo a comida somente uma delas! Por isso mamãe, se seu pequeno que começou a andar já não come como antes, fique tranquila, faz parte dessa fase da vida!

Agora vamos falar um pouco sobre as teorias da dificuldade alimentar. Kerzner, médico pediatra e estudioso desse tema, desenvolveu uma abordagem diagnóstica que separa em grupos de dificuldades alimentares, para melhor definir qual a conduta terapêutica em cada caso.

  1. Interpretação dos pais

Muitas vezes, os pais têm uma percepção incorreta de quanto a criança está comendo, seja porque outras crianças de mesma idade comem mais, ou mesmo porque a avó, tia, vizinha fica “dando pitaco” do que a criança come ou deixa de comer. Cada criança é única, e seu apetite também é individualizado. Com o tempo, os pais vão conhecer o apetite do seu pequeno e saber o quanto é o suficiente para ele, sem estresse, sem pressa…

  1. Ingestão altamente seletiva

A criança desenvolve uma “aversão sensorial aos alimentos” e se recusa de forma persistente a ingerir alimentos com sabor, textura, aparência ou cheiro particulares. Quando forçadas, apresentam náuseas e vômitos. Curiosamente, apresentam também dificuldade para pegar o alimento, manusear tintas, massa de modelar, pisar na areia ou grama.

  1. Criança agitada com baixo apetite

São crianças extremamente agitadas, curiosas e exploradoras, e por estarem sempre voltadas a alguma atividade, sentem pouca fome. Confundem-se com crianças com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, e cabe ao pediatra diferenciar dessa síndrome.

  1. Fobia alimentar

Como o próprio nome já diz, trata-se de um quadro em que a criança apresenta um medo desproporcional à exposição a um determinado alimento, motivado por alguma experiência traumática, como acidentes, (engasgos, asfixia, queimaduras com alimentos), procedimentos invasivos (intubação, sondagem) ou uso de coerção. Nesses casos, é necessária avaliação médica para avaliar a o problema e a necessidade de terapia a longo prazo.

  1. Presença de doença orgânica

Na presença de algum sinal de alarme, a recusa alimentar e/ou a falta de apetite podem ser os primeiros sintomas de uma doença orgânica.  Nesse caso, o pediatra deverá ser consultado.  Veja, abaixo, quais são esses sinais de alerta.

  • Sinais e sintomas que sugerem doença orgânica:
  • Dificuldade para engolir o alimento;
  • Dor para engolir o alimento
  • Engasgos que sufocam
  • Alimentação que é interrompida pela dor
  • Tosse imediata após a alimentação
  • Vômitos ou diarreia
  • Dificuldade de ganho de peso
  • Atraso no crescimento e no desenvolvimento

Já falamos um pouco sobre como funciona o corpo humano em relação aos mecanismos de saciedade, expliquei então os principais problemas relativos a dificuldades alimentares na criança, vamos agora às DICAS!

# Aprender pelo exemplo!

A aceitação alimentar da criança é influenciada, em primeiríssimo lugar, pelo exemplo dos pais. A criança vai comer o que ela vir no dia a dia dela, o que fizer parte do seu ambiente familiar. De nada adianta oferecer brócolis se você mesmo faz cara feia e não come de jeito nenhum…Por isso mamãe, se você torce o nariz para brócolis, chuchu ou abobrinha, está na hora de começar a comer!

# Estabeleça uma rotina

Outra coisa de extrema importância é o estabelecimento de rotina. Numa família em que não há rotina de refeições à mesa, a criança não aprenderá que existe um momento de comer! Ter horário para refeições é fundamental para a criança saber que existem limites e horários para as coisas. Aproveite o embalo (e a revolução) que um novo membro na família causa e comece a estabelecer hábitos saudáveis para a família toda.

# Explore o momento

Faça da refeição também um momento de atividade para a criança, em que ela possa interagir com a comida e se aventurar ao explorá-la. Promover experiências sensoriais com o alimento precocemente é fundamental para que a criança se envolva no momento do comer, tanto quanto no momento do brincar.

# Não force!

Aqui vale sim o slow parenting (adorei essa palavra!) já comentado pela Shirley. A criança apresenta mecanismos de saciedade próprios, variações no apetite ao longo do dia, e na introdução de novos alimentos, pode não aceitar novos sabores tão facilmente…é normal fazer cara feia no começo, dar náusea e até vômitos. A criança pode rejeitar o mesmo alimento por uma semana inteira, sem, no entanto, ser algo patológico. O que devemos fazer é continuar oferecendo como se fosse a primeira vez! Devemos aprender que cada filho é diferente e cada ser humano é único e tem seu tempo e momento para as coisas…

# Livre-se dos maus hábitos

Evite lanches rápidos e guloseimas, que acabam por saciar a criança rapidamente e a leva a pular a refeição principal e mais nutritiva. O doce é naturalmente mais palatável e melhor aceito desde o começo da introdução alimentar, por isso cabe aos pais introduzirem os outros sabores e torná-los conhecidos à criança.

Não crie hábitos ruins desde o começo. Evite comer na frente da televisão, pois a criança não presta atenção no que está comendo e acaba comendo mais do que deveria, pois o mecanismo de saciedade é prejudicado pela presença da televisão. Tal hábito pode levar a crianças obesas e sedentárias no futuro.

# Alimentos para iniciar a alimentação: o que dar e o que não dar

Não dê sucos: as recomendações da Academia Americana de Pediatria, do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa da Austrália e Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido são uma só: o suco não deve ser dado em crianças menores de 6 meses, em hipótese nenhuma, e para crianças acima de 6 meses não devem ser opção para introdução de alimentos. Motivos: Promovem a saciedade do bebê sem os nutrientes adequados e suficientes. Podem levar ao desmame e fazer a criança pular refeições. Concentram num recipiente único mais de uma fruta, o que acaba contendo açúcares demais e fibras de menos. Não promovem a experiência sensorial e visual que a fruta em si promove, fundamental nesse momento de introdução alimentar. Sucos adoçados (principalmente), aumentam o risco de cáries precoces da infância.

Vale a pena checar os 10 passos para a alimentação saudável do Ministério da Saúde e lembrar sempre que uma alimentação saudável é uma alimentação variada!

Obrigada por ficarem comigo até aqui! Espero que eu tenha esclarecido um pouco esse universo da alimentação. Compartilhem aqui também suas experiênciase dificuldades e deixem suas dúvidas sobre o assunto.

Um abraço

Dra. Kelly

 

Bibliografia

  1. Tratado da Sociedade Brasileira de Pediatria – 3ª edição, 2014.
  2. The Use and Misuse of Fruit Juice in Pediatrics. Pediatrics Vol. 107 No. 5 May 2001
  3. http://www.healthycanadians.gc.ca/healthy-living-vie-saine/infant-care-soins-bebe/nutrition-alimentation-eng.php#a2
  4. http://pediatrics.aappublications.org/content/99/1/15.abstract
  5. http://www.nhmrc.gov.au/_files_nhmrc/publications/attachments/n56b_infant_feeding_summary_130808.pdf

Colunistas MdM - pediatra kelly

 

 

Veja mais!