

Acho que gostei tanto desse texto porque nele a autora toca num ponto que sempre me incomodou antes de eu saber que o meu filhote seria um menino: como conduzir a questão da vaidade para ela não se tornar exagerada em nossas filhas (digo filhas porque os meninos não estão nem aí para isso, na grande parte dos casos). Sim, porque do jeito que estão as coisas hoje em dia, e do jeito que a mídia espalha a sua influência, meninas são bombardeadas com uma imposição desumana de beleza, vaidade e moda a todo instante.
Com vocês, a visão da Lisa Bloom sobre tudo isso:
Por Lisa Bloom, escritora
Eu fui a um jantar na casa de um amigo na semana passada e encontrei a sua filha de cinco anos pela primeira vez.
Maya, com seus cabelos castanhos encaracolados e olhos escuros estava adorável em sua camisola rosa cintilante. Quando a vi, eu queria gritar: “Maya , você é tão linda! Olhe para você! Dê uma giradinha e me mostre esse seu lindo modelito cheio de babados!”.
Mas não o fiz. Eu me calei . Como sempre faço em meus encontros com meninas, segurei a minha língua e controlei o meu primeiro impulso, que é sempre lhes dizer como estão bonitas, lindas, bem vestidas, bem cuidadas e bem penteadas.
Mas, o que há de errado com isso? Este é o padrão de conversa “quebra-gelo” que sempre temos com meninas na nossa cultura, não é? E por que não lhes dar um elogio sincero para aumentar a sua auto-estima? Afinal, elas são tão fofas que tudo que eu quero de verdade é esmagá-las quando as encontro. Honestamente!
Mostrando a meninas que a aparência é a primeira coisa que você nota nelas acaba mostrando que isso é mais importante que tudo. Isso pode acabar influenciando-as a fazerem dieta aos cinco anos, usar maquiagem aos 11, fazer cirurgia de seio aos 17 e aplicar Botox aos 23. Como se tornou normal o imperativo cultural de que meninas/mulheres devem ser atraentes 24h por dia, sete dias por semana, elas estão se tornando cada vez mais infelizes. E o que está faltando então? Uma vida de significado, uma vida de idéias e de leitura de livros, de valorização dos seus pensamentos e realizações.
E é por isso que eu me forço a conversar com as meninas da seguinte forma:
“Ei, o que você está lendo?” Perguntei com brilho nos olhos e complementei “Eu amo livros. Eu sou louca por eles”.
“Sim”, ela respondeu, “e eu consigo lê-los sozinha agora!”
“Uau, incrível!”, eu disse.
“Qual é o seu livro favorito?”, perguntei.
“Eu vou pegar! Posso ler para você?”
Purplicious foi escolha de Maya e era um livro novo para mim. Então, Maya se aconchegou ao meu lado no sofá e orgulhosamente leu em voz alta cada palavra que contava a história da heroína que ama rosa, mas é atormentado por um grupo de meninas da escola que só se vestem de preto. E por sinal, o livro era sobre o que as meninas vestem e como as escolhas do seu guarda-roupa definem suas identidades. Assim que Maya leu a página final e fechou o livro, eu guiei a conversa para algumas questões mais profundas do livro: atitude de meninas más, a pressão que elas exercem sobre outras e como não seguir essa pressão do grupo. Ainda, disse a ela que a minha cor favorita é o verde, porque eu amo a natureza, e ela concordou.
Em nehum momento na nossa conversa nós falamos sobre a roupa, o cabelo, o corpo ou quem era bonita. E é surpreendente como é difícil ficar longe desses temas quando se conversa com meninas. Mas eu sou teimosa!
Eu disse a ela que eu tinha acabado de escrever um livro e que eu acreditava que ela iria escrever um também um dia. Ela ficou bastante empolgada com a ideia. Nós duas ficamos tristes quando Maya teve que ir para a cama, mas eu lhe disse que da próxima vez ela poderia escolher outro livro e nós o leríamos e falaríamos sobre ele. Opa. Isso acabou a deixando empolgada demais para dormir e ela acabou descendo de seu quarto algumas vezes.
E assim eu fiz um pouquinho de oposição a uma cultura que envia muitas mensagens erradas para as nossas meninas. Foi um pequeno empurrãozinho para valorizar o cérebro feminino. Um breve momento dando um exemplo a ser seguido. Intencional. Será que estes meus poucos minutos com Maya pode mudar a nossa multibilionária indústria da beleza, os reality shows que denigrem as mulheres ou a nossa cultura encantada por celebridades? Não. Mas eu estava pelo menos mudando a perspectiva de Maya, pelo menos naquela noite.
Na próxima vez que você encontrar uma menina, tente isso. Ela pode ficar surpresa e um pouco insegura no início da conversa, porque poucos perguntam esse tipo de coisa para ela, mas seja paciente e insista um pouco. Pergunte o que ela está lendo. O que ela gosta e não gosta e por quê? Não há respostas erradas. Você só está iniciando uma conversa inteligente.
Texto original de:
Lisa Bloom – How to talk to little girls. Texto original aqui.