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Eu escapei da violência obstétrica

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Muito tem se falado em violência obstétrica em nosso país ultimamente, o que eu acho excelente, pois é um assunto importante, crítico e que está mais do que na hora de vir à tona. E quando se fala ou se pensa nisso, o que primeiro vem em mente são cenas de agressão durante o parto, de médicos e enfermeiras gritando, amarrando pernas e braços e empurrando barrigas.É importante sabermos que isso é sim violência obstétrica, mas que violência obstétrica não é só isso. Todo descaso ou mal atendimento durante a gestação é violência obstétrica, a gestante não ter direito a um acompanhante durante o parto é violência obstétrica, a gestante não ter direito a escolher a forma que seu filho virá ao mundo também é violência obstétrica.

E foi esse último tipo de violência que eu quase sofri. Graças a Deus e ao meu sexto sentido hoje eu digo QUASE, mas essa podia ter sido uma triste realidade para mim.

Vou contar um pouco dessa história para vocês…

Há uns quatro anos atrás eu comecei a consultar com um ginecologista e obstetra bastante conceituado aqui de São Paulo. Cheguei a ele por excelentes recomendações e sempre me senti bem atendida (tudo bem, ele nunca foi um daqueles profissionais super humanos e calorosos, que eu prefiro, mas tecnicamente jamais deixou a desejar). Assim, quando engravidei, logicamente nem pensei em trocá-lo por outro profissional, afinal, ele já me atendia há mais de dois anos, conhecia meu histórico e tudo corria bem até aquele momento.

Mas logo no início da gestação, comecei a perceber que algumas coisinhas não iam bem nessa nossa nova fase. A principal delas era que as consultas eram breves e bem práticas (ele sempre foi assim, mas agora achei que seria diferente, por conta de eu estar grávida e cheia de dúvidas), sem eu receber informações adicionais para me preparar para o que estava por vir. Ele simplesmente me examinava e perguntava se eu tinha alguma dúvida ou questão e as respondia rápida e secamente, com aquela cara de tédio e de “ai, são todas iguais mesmo!” (e olha que não eram consultas de SUS ou de convênio, mas consultas particulares e bem caras). Mas mesmo um pouco desconfortável, segui indo nas consultas, afinal, o tempo ia passando e eu sentia que ele já me conhecia, já conhecia meu histórico e era melhor continuar com ele do que tentar qualquer mudança (como ficamos inseguras e dependentes nesse período, Deus do céu!).

Só que o tempo foi passando mesmo, a gestação foi evoluindo, e eu ficando cada vez mais perdida, desconfortável e pouco satisfeita. Chegava ao ponto de eu sentir dor e desconforto e preferir não ligar para o médico para não incomodá-lo. Desagradável ao extremo. Totalmente sem cabimento. E para completar, toda vez que eu tentava falar sobre o meu parto, conversar, discutir, dizer qual era a minha vontade e como ele iria me ajudar nisso, ele desconversava, dizendo que esse era um assunto que não adiantava falarmos naquele momento, pois só na hora poderíamos saber se o bebê poderia mesmo nascer de parto normal ou não. Ah, tá! Tudo bem que é sim só na hora que vamos ter certeza se um parto normal é realmente possível, mas muito antes disso a gente já poderia falar sobre o assunto, ele poderia responder os meus questionamentos, me ajudar nas minhas inseguranças e por aí afora.

Quando eu estava com sete meses de gestação, em mais uma tentativa de conversar sobre o parto e não obter nada além de desculpas o meu sangue ferveu, a minha paciência acabou a minha clara visão das coisas voltou a existir. Graças a Deus! Eu caí em mim em percebi que eu nunca iria conseguir o parto normal que eu tanto queria se continuasse com aquele médico. Saí da última consulta disposta a nunca mais voltar e foi exatamente o que fiz.

No alto dos meus sete meses de gestação decidi que iria buscar outro obstetra, que iria atrás de alguém que me fizesse sentir confortável nas consultas, à vontade para ligar quando precisasse e que mais do que responder perguntas também me passasse informações adicionais e me ajudasse a passar por essa fase de tantos questionamentos e inseguranças com naturalidade e serenidade.

A louca aqui resolveu fazer isso com SETE meses de gestação! Quem iria aceitar uma gestante a essa altura do campeonato? Eu não sabia, mas precisava fazer isso. Meu coração estava no comando nesse momento e eu iria segui-lo.

Nessa hora, minha sogra sugeriu que eu conversasse com um primo dela, que também é GO e que eu nem sequer sonhava que era médico (apesar de termos algum contato, eu nunca cheguei a saber o que ele fazia da vida). No dia seguinte, liguei para ele, expliquei a situação, e disse que queria trocar de obstetra e que havia pensado nele.

Nesse instante, ele deve ter ficado branco, lívido e quase caído para trás (olha a situação na qual eu o estava envolvendo! 7 meses de gestação!). Ele comentou que eu estava sendo atendida por um excelente profissional e que também já estava bem adiantada na gravidez, que não era padrão esse tipo de mudança mas que se eu quisesse, a gente poderia conversar, sem compromisso.

Quando cheguei no consultório, mais uma vez, ele comentou sobre o excelente profissional que estava me tratando até aquele momento e questionou porque eu não queria mais continuar com ele. Fui clara: disse que eu não me sentia confortável com ele, não ligava quando tinha dúvidas ou até quando estava com algum mal estar e que, acima de tudo, tinha certeza que ele iria me encaminhar para uma cesárea, nem deixaria eu tentar um parto normal. Eu sentia isso. Eu sabia disso.

Bom, foi muita sorte eu ter tido esses 15 minutos de rompante hormonal e ter decidido mudar de médico, pois o novo que encontrei, por obra divina, era super a favor de parto normal, daqueles profissionais que a consulta dura duas horas e que você se sente tão à vontade que quase o chama para tomar um café. E não é porque ele é da família, mas porque ele é assim. É o jeito dele.

Enfim, comecei a me tratar com esse novo obstetra e ele foi tudo que eu precisava naquele fim de gestação. Ele, mais do que responder às minhas dúvidas, me orientava e tranquilizava. Ele me ajudou a acreditar que o Léo iria chegar sim de parto normal quando nem mais eu, que tanto queria isso, confiava nessa possibilidade (ele demorou muito para encaixar).

Enfim, eu consegui fugir de um médico que tem por padrão só fazer parto cesárea a tempo. Só fiquei sabendo disso depois que mudei de GO e contei meu caso para alguns profissionais da área da saúde que conhecem a sua fama (a positiva, de ser um ótimo médico, e a negativa, de só fazer cesárea agendada, devido a sua agenda super lotada).

Assim, depois de contar essa história para vocês, quero aqui deixar um alerta: pensem muito bem no tipo de tratamento que vocês esperam durante a gestação e no tipo de parto que vocês querem ter. Não fiquem achando que só porque o obstetra escolhido é bem conceituado e suas consultas são caras que vocês terão o atendimento e um parto que sempre sonharam (pode acontecer, mas não é regra, comigo, por exemplo, foi bem diferente). E se vocês acharem que o obstetra que as atende até esse momento pode não se encaixar no que vocês buscam, mudem sem medo. Quando a gente escuta falar de violência obstétrica nem imaginamos que nós também podemos ser uma de suas vítimas. Isso porque as informações sobre esse assunto ainda não estão muito claras muitos médicos nos levam a crer que as coisas são como são e que tudo isso é natural, que não temos como escapar. Ledo engano!

Se eu tivesse continuado com o meu antigo obstetra eu não teria tido o Léo de parto normal, ele teria dado a desculpa da demora no encaixe e o teria tirado de mim com 38 ou 39 semanas de gestação. Tudo bem se essa fosse a minha vontade, sem problemas, pois eu não julgo quem opta por cesárea e entendo perfeitamente a decisão. Mas essa não era a MINHA escolha, ele estava indo contra o meu desejo, essa atitude seria uma agressão enorme, um desrespeito e um típico caso de violência obstétrica.

Um apelo: pensem bem no que vocês querem. E comparem o seus desejos com as atitudes dos profissionais que as atendem. Vocês também podem se ajudar.

Para quem quiser saber mais sobre o assunto violência obstétrica eu trouxe abaixo um vídeo e alguns links. Vale a pena se inteirar sobre o tema.

Vídeo: Violência obstétrica, a voz das brasileiras

Sites:

Como fugir da violência obstétrica – Vila Mamífera
Como denunciar a violência obstétrica – Vila Mamífera
Eu fui vítima de violência obstétrica – Carta Capital
Os ventos estarão mudando no cenário obstétrico brasileiro? – Minha Mãe que Disse

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