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Parto de cócoras na Noruega

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Acho que vou lançar uma nova seção aqui no blog: partos pelo mundo. Ehehehe! Já tivemos aqui o relato de um parto feito no Brasil (o meu), o de um ocorrido na Alemanhã, e hoje é a vez de um parto na Noruega, e ainda por cima um pouco diferente, de cócoras!
Na verdade, eu adoro relato de partos, gosto de saber como cada bebê veio ao mundo, como cada mãe se sentiu, como foi esse primeiro encontro tão emocionante. Acho que sinto isso porque amei o parto do Léo, porque achei a experiência mais incrível da minha vida (apesar da dor indescritível) e porque morro de vontade de passar por isso de novo.
Mas enfim, independente das razões, mais uma vez estou eu aqui trazendo o relato da chegada de uma criança ao mundo. Trata-se do nascimento do Gabriel, hoje com quase três anos, filho da gaúcha Melissa Kaste, casada com um Norueguês e há alguns anos habitante do hemisfério norte.

Meu parto na Noruega, 

por Melissa Bender Dellamea Kaste

Desde que recebi a confirmação da minha gravidez eu já comecei a me sentir especial. Saber que tu estás carregando um serzinho dentro de ti,  feito por ti e pelo teu amor, é muito emocionante. E também, nesse mesmo momento, fiquei impressionada com as facilidades que as gestantes tem aqui na Noruega: consultas, exames, cursos, livros, conselhos, hospital, parto, pós-parto, e tudo GRATUITO e com prioridade! Além disso, sempre fui muito bem tratada pelos profissionais da saúde com os quais tratei (salvo raras exceções, que, infelizmente, sempre há).
 
Bom, vou contar um pouco sobre como as coisas acontecem desse lado do mundo. Aqui na Noruega, quem faz o acompanhamento durante praticamente toda a gravidez é o médico geral (aqui todos tem seus médicos específicos) e uma enfermeira obstetra. As visitas são mais frequentes no consultório da enfermeira, que é chamada aqui de jordmor (tradução literal é parteira), do que no do médico. Fui somente duas vezes ao obstetra, que fez meus ultrassons, e consultei uma vez com meu ginecologista no Brasil. E é a jordmor mesmo que faz o parto, quando natural. O obstetra só é chamado em caso de necessidade de parto cesária.
 
Meu nenê estava previsto pra nascer no dia 6 de agosto de 2010 e foi exatamente quando ele nasceu. Me falaram que somente 10% dos nenês nascem no dia planejado e eu sempre achei que ele ia nascer 2 semanas antes, já o meu marido achou que ele viria alguns dias depois. Mas não, ele quis se incluir nos 10% e veio no dia certinho!
 
Na minha última consulta com a jordmor, que foi uma semana antes da data prevista para o nascimento, ela me disse: espero não vê-la daqui a uma semana e sim alguns dias depois, com o seu bebê nos braços. Ela ainda me ensinou alguns truques “naturais” para dar um empurrãozinho no nenê: fazer caminhadas, subir e descer escadas e, inclusive, ter relações. Isso mesmo! Tudo isso ajuda acelerar o processo.
 
Dito e feito! Na madrugada do dia 5 para dia 6 de agosto, por volta de 2h, eu comecei a sentir as famosas contrações. Entretanto, como fui instruída a não correr pro hospital logo de cara, optei por esperar que elas ficassem mais seguidas. E assim foi, por toda a noite, subindo e descendo escadas e tentando dormir em intervalos de 10/15 minutos, um pouco no sofá, um pouco na cama. Quando eram umas 7 horas da manhã, acordei meu marido e disse que não aguentava mais e que as contrações já estavam com aproximadamente 5 minutos de intervalo. Ele então ligou para o hospital, para descrever a minha situação e pra eles já irem preparando um lugar pra mim.
 
Chegando ao  hospital, eles me examinaram. Como eu estava com três centímetros de dilatação somente, me colocaram em um quarto para esperar mais um pouco. Colocaram também uma cinta ao redor da minha barriga, com eletrodos para medir o coração do nenê. Até ai tudo bem, mas as dores foram ficando mais intensas e eu só pedia pro meu marido me ajudar e apertava a mão dele com toda a minha força. Até pela minha mãe, que estava tão longe, eu chamei (risos!). Senti uma dor que nunca havia sentido na vida e que é quase inexplicável. Uma amiga pediu pra eu tentar descrever pra ela como era essa dor e eu disse que era como se alguém estivesse tentando abrir a tua bacia com as duas mãos.
 
Entretanto, apesar das contrações estarem cada vez mais fortes e mais seguidas (a cada 2 minutos praticamente), a minha bolsa ainda não havia rompido e a dilatação estava muito lenta. Mas eu não me desesperei. No lugar, pensei: Mas que nada, vamos continuar! Meu esposo, querido e paciente, do meu lado o tempo inteiro, enquanto eu berrava de dor e as enfermeiras sempre muito queridas e atenciosas, me dizendo que eu estava indo super bem, que o nenê estava ótimo e que eu deveria continuar firme. Além disso, traziam água gelada com um canudinho e colocavam na minha boca, passavam um paninho úmido na minha testa, faziam carinho no meu rosto e só me davam palavras de apoio, de incentivo. Sim! Eu tinha que continuar!
 
Em um dado momento, perguntei sobre a anestesia peridural,  a qual a minha mãe sempre dizia pra eu tentar evitar, e as enfermeiras também respondiam o mesmo: a tua situação é ótima, tu não precisa de anestesia. E lá estava eu, desesperada, sem NADA de anestésico. Até que me trouxeram uma máscara pra respirar um gás. Um pouquinho antes de cada contração me pediam pra respirar fundo nessa máscara. De repente eu estava “em outro mundo”. Meu marido tentava falar comigo e eu não conseguia nem responder, só sorria, e isso aliviou MUITO as dores. Mas o efeito passava rápido demais e depois de umas 10 baforadas já não fazia mais efeito, então joguei longe a tal máscara.
 
Um pouco depois, resolveram romper a minha bolsa. O tampão já havia saído há um tempinho atrás, quando fui no banheiro. Nesse momento, o processo acelerou e a dilatação foi aumentando. Tudo o que eu queria era empurrar e tirar o meu nenê dali de dentro, mas só me diziam que não era para eu começar a empurrar ainda.
 
Depois de praticamente 10 horas de trabalho de parto (a partir da hora que eu fui para a sala do parto, fora toda a madrugada de contrações), a enfermeira me disse que eu já estava com 10 cm de dilatação e que então poderia começar a empurrar. Depois de algumas tentativas ela me diz: vamos te virar e tu vais ficar de cócoras. Naquele momento, eu só queria que ele saísse e me virei. Forcei mais algumas vezes e meu marido disse, só pra descontrair um pouco: estamos vendo a cabecinha e é cheia de cabelo, será que não é uma menina?! E eu sentia ele ali trancando no meio do caminho, pobrezinho! Mas na próxima empurrada o Gabriel finalmente nasceu, às 18:35 do dia 06/08/2010, com 3,725 kg e 51 cm!
 
Viraram-me rapidamente e já o colocaram no meu colo. Meu Deus, que emoção ver aquela carinha de “joelho”, chorando e tão cansado quanto eu! Sim, porque trabalhamos duramente juntos o tempo inteiro! E eu mal conseguia segurá-lo, porque eu estava mesmo exausta.
 
Meu marido cortou o cordão umbilical e levaram ele pra pesar, limpar e colocar uma roupinha. Tudo na mesma sala onde estávamos. Nesse meio tempo, as outras enfermeiras ficaram cuidando de mim. Enquanto uma dava uns pontinhos em mim (que também doeram, mas nada comparado com o que eu tinha acabado de passar) a outra veio falar comigo, secar meu rosto, me dar água e me dizer que eu tinha feito um trabalho maravilhoso, que eu deveria me orgulhar e que o Gabriel era lindo e perfeitinho (aqui, eles não tem o hábito de fazer episiotomia).
Primeira mamada do Gabriel, com alguns minutos de vida.
Depois de alguns minutos eu já me levantei, fui tomar um banho, com a ajuda da enfermeira, e fui descansar em uma cama ao lado. Colocaram o Gabriel do meu lado e eu dei o peito pra ele, que já abocanhou de primeira e mamou um pouquinho! Graças a Deus eu não tive problema nenhum pra amamentar. Só ficou dolorido nos primeiros dias, mas nada que uma pomadinha de lanolina não resolvesse. Logo eu não senti mais incômodo nenhum.
E então veio a enfermeira com uma bandeja com duas taças (com suquinho), florzinhas e uma bandeirinha da Noruega, para parabenizar os papais. Achei uma doçura esse gesto. Tão pequeno, mas tão significativo pra nós.
Logo fui para o quarto e meu marido trouxe uma comidinha pra nós. Detalhe: tem uma cantina na maternidade, onde todas as mães e pais podem comer à vontade e quando quiserem. O almoço e o jantar são servidos em horários determinados.
À noite, meu marido teve que voltar pra casa, pois os pais não podem dormir no hospital. Fiquei um pouco triste por ter que ficar sozinha, mas o pessoal cuidou tão bem de mim, que não pude reclamar. O Gabriel ficou do meu lado, numa caminha o tempo inteiro. Disseram-me que, caso ele chorrasse muito e eu estivesse muito cansada, era pra eu puxar uma cordinha que eles viriam cuidar dele pra eu descansar (afinal, era importante eu recuperar minhas forças pra cuidar dele depois). E assim foi minha primeira noite, consegui dormir bem e me recuperar. Além disso, os enfermeiros foram sempre muito atenciosos e carinhosos, ajudando a cuidar dele em todos os momentos.
jordmor (enfermeira obstetra) que fez meu parto veio me ver no dia seguinte e uma das coisas que eu disse pra ela foi: “Desculpa por ter gritado tanto, que vergonha!”. Ela apenas respondeu: “Imagina! Tem mães que gritam muito mais, nem te preocupa!” e sorriu. E eu só pensei: “Mas como é possíve?!!!!”
Depois que tudo passou, eu lembrei que quando eu perguntava sobre as dores dos três partos normais para a minha mãe ela só respondia: “Sim, doeram. Mas, depois de se ver a carinha do nenê, se esquece de tudo!”.  Na verdade, eu também não procurei perguntar muito para ninguém durante a gravidez, quis deixar acontecer. Também não sei se seria bom me falarem que a dor era quase que insuportável, porque eu ficaria mais nervosa antes do parto. Mas tudo bem, acho que foi melhor assim mesmo.
Gabriel no seu segundo dia de vida
Fiquei três dias no hospital. Nesse tempo eu caminhava com o Gabriel no colo pelos corredores, ia na cantina tomar um café, conversava com algumas mães e recebia visitas da família. Me senti realmente super bem assistida e à vontade lá.
Claro que nem todos tem a mesma sorte que eu. Já ouvi alguns casos de mães que não tiveram a mesma experiência boa que eu tive (apesar de toda a dor), ou seja, tiveram o “azar” de encontrar profissionais nem tão sensíveis como os que eu tive o prazer de conhecer.
Eu digo que não me arrependo de nada, mas às vezes, me questiono como teria sido se eu tivesse recebido anestesia e e evitado tanto sofrimento.Por outro lado, em muitos momentos, fico feliz de ter tido meu filho aqui, principalmente depois de ler tantas coisas sobre a violência obstétrica que muitas mães sofrem no Brasil (e em muitos outros lugares do mundo, é claro.).
Hoje o Gabriel tem 2 anos e 8 meses. Está lindo, forte e é um poliglota!

 

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