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Transtorno de Ansiedade de Separação

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No mês passado, a psicóloga Raquel Suertegaray escreveu sobre a fase da angústia da separação, que costuma acontecer com crianças quando elas estão 7 ou 8 meses de idade. No seu texto, ela adiantou que nesse mês abordaria outro aspecto desse assunto, quanto a ansiedade se torna um transtorno e não mais uma fase natural do desenvolvimento da criança.

Eu, particulamente, nunca tinha ouvido falar do Transtorno de Ansiedade da Separação e achei excelentes os esclarecimentos feitos pela Raquel.

Vale a pena ler o texto, se informar e estar preparado para identificar qualquer alteração no comportamento da criança que pode significar um problema sério e não só uma fase desafiadora pela qual ela está passando. Boa leitura!

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Photo Credit: 55Laney69 via Compfight cc

 

Transtorno de Ansiedade de Separação

Por Raquel Suertegaray

Olá mamães, mais um mês passou voando e aqui estou eu novamente! Hoje vou dar continuidade ao tema do mês passado – ansiedade de separação – porém falando de um outro viés. Inicialmente, abordei a ansiedade da separação como etapa do desenvolvimento, pertencente à normalidade, a algo que todas as crianças passam, algumas de forma mais e outras menos intensa. Hoje vou abordar um quadro que extrapola o esperado, provoca um sofrimento intenso e prejuízos, o Transtorno de Ansiedade de Separação.

Trata-se de uma ansiedade que atinge um grau patológico, que foge da normalidade por paralisar o indivíduo, trazendo prejuízos à criança e à família. É considerado um transtorno mental, da família dos transtornos de ansiedades, que no Brasil estima-se apresentar uma prevalência em torno de 5% entre crianças e adolescentes, sendo o Transtorno de Ansiedade de Separação o único diagnosticado exclusivamente na infância.

Sua principal característica é um nível de ansiedade muito elevado diante do afastamento de casa ou dos pais, que não se explica pela fase do desenvolvimento que a criança está vivendo. Trata-se de uma reação exagerada e bastante sofrida, que pode apresentar manifestações corporais inclusive, desde sudorese até dores de barriga, diarreia e febre.

Para ser considerado Transtorno de Ansiedade de Separação, a criança deve apresentar um conjunto de sintomas, que envolvem sofrimento excessivo e recorrente frente à ocorrência ou previsão de afastamento de casa ou dos pais. Vale ressaltar que pais podem ser entendidos como as pessoas com as quais a criança apresenta um vínculo forte.

O afastamento ou a “possibilidade de” passam a causar medo persistente e excessivo de que algo aconteça com estas pessoas quando elas se ausentam, da mesma forma que pode surgir medo que alguma catástrofe aconteça e provoque uma separação, por exemplo como no caso de assaltos, acidentes, sequestros, etc.

Nos casos de Transtorno de Ansiedade de Separação, em razão do elevado nível de ansiedade que acontece durante o período de afastamento, a criança costuma apresentar uma relutância importante para ir para a escola ou a qualquer outro lugar, pelo medo da separação, da mesma forma que evita ficar sozinho ou longe dos pais.

Esta relutância também é observada comumente na hora de dormir, pois simbolicamente, dormir implica em ficar sozinho e, ao dormir, nos entregamos a nossos próprios pensamentos, que nestes casos, costumam ser aterrorizantes. Com isto a criança adormece apenas na presença física de um dos pais, precisando com frequência assegurar-se da presença deste diversas vezes durante a noite, o que a impede, por exemplo, de pernoitar longe de casa, na casa de amigos ou familiares, e pode trazer dificuldades no campo da socialização.

É comum também a presença de pesadelos repetidos envolvendo o tema da separação, o que é perfeitamente compreensível, tendo em vista o nível de angústia permanente que a criança experimenta ao longo do dia durante o curso deste transtorno.

O quadro, muitas vezes, se completa com a presença de queixas de sintomas somáticos, como dores de cabeça, dores de barriga, náusea ou vômitos, quando a separação de figuras importantes de vinculação ocorre ou é prevista. Acho importante ressaltar que a criança não forja tais sintomas, ela realmente os sente, é como se seu organismo experimentasse uma espécie de colapso.

Nós adultos, principalmente os mais ansiosos, sabem bem como é isto. Quem já não sentiu uma dor de barriga antes de uma entrevista de emprego ou dor de cabeça depois de uma situação de tensão? Imaginem o quanto é sofrido viver de forma constante neste estado?!

Em alguns casos pode ser difícil diferenciar a ansiedade de separação esperada do desenvolvimento de um transtorno e, muitas vezes, apenas o tempo vai nos mostrar o que de fato se passa. A diferença costuma estar no campo da quantidade, ou seja, da “quantidade” de tempo e de sofrimento envolvido. Minha sugestão é que a família busque suporte profissional se desconfiar que algo não vai bem com a criança.

Este quadro deve durar pelo menos 4 semanas e iniciar antes dos 18 anos, portanto, ocorre apenas com crianças, podendo ter seus desdobramentos na idade adulta é claro, porém com outra nomenclatura e outros sintomas. É importante ressaltar que o Transtorno de Ansiedade de Separação deve ser levado a sério, pois, além de provocar um sofrimento muito intenso, pode causar importantes prejuízos à saúde mental da criança se não tratado adequadamente. Diversas pesquisas apontam que TAA é fator de risco para depressão e para o desenvolvimento de outros Transtornos de Ansiedade na Idade Adulta.

Estas situações críticas me fazem acreditar no quanto a escolha do pediatra e da escola são importantes para as crianças e para os pais. Nestas horas, contar com profissionais em quem confiamos, treinados, com conhecimentos consistentes acerca do desenvolvimento infantil e capazes de se envolver verdadeiramente com seu trabalho, assumindo uma postura empática, faz toda a diferença.

O surgimento do Transtorno de Ansiedade de Separação pode estar ligado a estressores pontuais ou situações traumáticas, como separações, mortes, acidentes, violências. Porém, geralmente, estas crianças já apresentaram anteriormente sinais de apego inseguro ou outras fragilidades e são oriundas de famílias com casos de transtornos de ansiedade.

Algumas das coisas que me chama a atenção de forma negativa e que entendo contribuírem para estes quadros (mesmo que não sejam causas diretas), é o habito que algumas famílias escolhem para colocar limites em seus filhos utilizando o medo do mundo como recurso de coação, por apresenta-lo como muito assustador ou com ameaças de abandono ou de optar por enganar a criança em relação aos afastamentos, fugindo quando a criança se distrai.

Nenhuma destas formulas contribui para o desenvolvimento da segurança e do apego seguro, que faz a criança ter certeza de que seus cuidadores, que representam sua fonte de segurança maior, vão e voltam. Claro que garantias totais não existem, ainda mais no mundo de hoje, porém, também é verdade que o habitual é voltarmos ilesos para. Se algum dia uma tragédia acontecer, lidamos com o problema, mas não há razão para antecipá-las. Estaremos fortalecendo nossos filhos e os protegendo psiquicamente se os criarmos autônomos, seguros e confiantes, por isto é importante sermos honestos com eles sempre.

Uma vez estabelecido um Transtorno de Ansiedade de Separação, será necessária terapia para a criança e orientação aos pais. Em alguns casos, pode ser necessário combinar uma terapia medicamentosa e em outros não, porém, esta última, apenas um profissional capacitado, psiquiatra portanto, poderá avaliar.

Nos casos onde há afastamento da escola, deve-se trabalhar a reversão do mesmo como um dos objetivos iniciais, pois quanto maior o afastamento, mais as coisas se complicam. Portanto, tirar seu filho da escola não estará o ajudando e sim aumentará o problema, mesmo que esta medida pareça colocar fim a seu sofrimento.

A família precisa ser orientada para conduzir os manejos com a criança. É fundamental haver uma conduta uniforme que estimule a autonomia e auto-confiança e que siga uma mesma linha, pois mensagens contraditórias apenas contribuirão para o agravamento do quadro, tendo em vista despertarem mais ansiedade.

O tratamento é fundamental e o problema não deve ser ignorado, pois traz prejuízos significativos para a vida social e escolar da criança. Um dos efeitos secundários é uma dependência excessiva dos pais, que prejudica o curso normal do desenvolvimento da criança e do adolescente. Devemos considerar também que um sofrimento permanente, prolongado, que se projeta trazendo prejuízo nas relações sociais aumentam o risco de depressão e outros transtornos de ansiedade ao longo da vida.

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